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55 anos de carreira e 50 mil fichas depois, o descanso merecido

A pandemia e o isolamento social forçaram profissionais idosos de todo o país a antecipar suas aposentadorias. Com o Dr. Clemente Isnard Ribeiro de Almeida não foi diferente. Mas, se para alguns o encerramento precoce ou forçado das atividades laborais trouxe tristeza, para o Dr. Clemente Isnard a nova etapa de vida foi recebida com serenidade e alegria. A família, que sempre veio em primeiro lugar em meio à atribulada vida profissional, agora é o foco em tempo integral.

Nascido em São Paulo (SP), em 1/8/1939, Clemente Isnard Ribeiro de Almeida viveu seus primeiros anos com os pais e os cinco irmãos na Rua Monte Alegre, em Perdizes. Seu avô foi o Dr. Joaquim Ribeiro de Almeida, que atuava como clínico, e de seu pai, o Dr. Hugo Ribeiro de Almeida, herdou a paixão pela medicina, em especial, pela Otorrinolaringologia. “Meu pai tinha basicamente um consultório e dava aulas teóricas e ensinava cirurgia em um instituto chamado Policlínica, que não era uma Universidade, mas permitia passar os conhecimentos teóricos e práticos. Sua satisfação não eram os títulos, que possuía aos montes, mas sim passar o conhecimento da especialidade, em uma época em que não havia residência. Recentemente, o Dr. Douglas Menon, muito reconhecido na Sociedade, especialmente no Hospital Sírio Libanês, onde operava, me mandou uma foto na qual ele aparece como residente entre os assistentes e funcionários da Policlínica. Foi um prazer receber essa recordação, pela honra de ter o Dr. Menon ligado ao meu pai em sua formação”.

Foto: Arquivo Pessoal

Admirador do pai e do avô, “que eram pessoas fantásticas, muito bacanas”, herdou deles a profissão. “Via as pessoas admirando o meu pai e, por muito tempo, fui o filho do Dr. Hugo. Com o tempo, encontrei o meu caminho”, lembra. Após concluir a residência na Universidade de São Paulo (USP), em 1965, Dr. Clemente Isnard iniciou uma carreira alicerçada em conhecimentos adquiridos na Faculdade e em congressos nacionais e internacionais. Permaneceu na USP como assistente concursado, por cerca de 10 anos. “Saí de lá por questões pessoais”, resume.

Pouco tempo antes de se desligar da USP, ingressou no time de especialistas que ajudou a criar a Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ), localizada no município homônimo e que oferece cursos de graduação em Medicina, Residência Médica, especialização e programas de mestrado e doutorado. Em Jundiaí, permaneceu por 25 anos. Foi o primeiro professor otorrinolaringologista da instituição, e o curso se desenvolveu muito bem. Formou assistentes que fizeram doutorado e concursos para livre docências. Nesse período, teve os residentes que, hoje, são 8 a cada ano, por 3 anos. “O mais importante é que muita gente por lá se formou, gente do Brasil todo, e sempre reencontro meus ex-alunos da residência, como por exemplo, o Professor titular de ORL da USP, o Professor titular de ORL de Palmas, de Belém do Pará, amigos nos Estados Unidos e em muitos estados do Brasil. Quando fui ao Jalapão, encontrei um grupo em que todos haviam sido meus alunos e fiquei feliz ao ver que eles estavam muito bem em Palmas (TO). Fui muito bem recebido e foi um prazer rever as pessoas”, conta.

Brecheret - Clemente Isnard

Foto: Arquivo Pessoal

Um Brecheret para chamar de seu
Até hoje a perícia, a vivacidade e o bom humor do Dr. Clemente Isnard são lembrados na FMJ, já que a instituição inaugurou uma placa em sua homenagem na sala de dissecação. Por falar em placa, uma das histórias mais interessantes de seu repertório de vida não tem nada a ver consigo, mas com o avô, com uma placa de bronze e com o escultor Victor Brecheret. “Meu avô era muito ligado à Santa Casa de São Paulo e um dos pioneiros da antiga universidade que lá existia, e que depois mudou de endereço indo para novas construções que ocupa até hoje. Por isso, a Santa Casa encomendou junto ao Brecheret, um dos maiores escultores da história do nosso país, uma efígie do meu avô, em bronze. Durante muito tempo, a placa ficou exposta e, um belo dia, foi retirada. Eu ia com regularidade ao local. Um dia, perguntei o que foi feito da escultura com o rosto do meu avô. Quando soube que ela estava jogada em um canto escuro, exposta à ação do tempo, não pensei duas vezes”, revela. A relíquia, que foi trabalhada pelas mesmas mãos habilidosas que deram forma, entre outras obras, ao Monumento às Bandeiras (que fica na entrada do Parque do Ibirapuera), tem status de tesouro no consultório da filha do Dr. Clemente Isnard – sim, a família já está na quarta geração de médicos, e na terceira geração de otorrinolaringologistas. “Sempre nos consultam sobre a possibilidade de doação da placa para algum museu, mas a Roberta não abre mão”, diz.

Em parceria com o marido, o Dr. André Duprat, a Dra. Roberta Ribeiro de Almeida leva adiante o legado do pai. “Minha filha e meu genro herdaram um arquivo com cerca de 50 mil fichas”, orgulha-se. O médico manteve, por muito tempo, um consultório no mesmo andar da sala da filha, assim como o genro, e todos compartilhavam a mesma secretária e arquivos. Teve, também, uma clínica particular. Por suas mãos, “que operaram muitos ouvidos, narizes e amídalas”, passaram muitos pacientes, entre eles o piloto Airton Senna (“meu paciente desde pequenininho”) e o ex-presidente Lula. No entanto, a vida em consultório foi sempre pautada por muito planejamento, estratégias e decisões que, com o tempo, se mostraram acertadas. “Quando minha filha e meu genro saíram da residência, propuseram fazer o atendimento por convênios, como forma de conquistar a clientela. Mas eu não deixei, e o tempo mostrou que eu tinha razão, pois, aos poucos, foram chegando os pacientes. E, hoje, eles estão muito bem. São muito procurados. O André também está na Santa Casa, a Roberta foi da Escola Paulista de Medicina e hoje atende só no consultório. Ambos são doutores pela USP, e o André opera na Santa Casa. Ele é bem reconhecido em todo o país”, revela.

Experiências internacionais ajudaram a formar colegas no Brasil
Quando decidiu se aposentar, o médico escreveu uma mensagem para algumas pessoas e recebeu, ao todo, 53 cartas em resposta. “Preferi deixar os clientes antes que eles me deixassem”, afirma.

Antes de engavetar de vez o otoscópio, Dr. Clemente Isnard acompanhou, por 55 anos, a evolução da especialidade. Sempre se manteve atualizado. “Até o ano passado, eu assinava 5 revistas médicas, sendo 2 da especialidade e outras 3 gerais. A cada ano que eu ia para a Academia Americana, eu aprendia mais e mais. Fui por cerca de 30 anos ininterruptos”. 

Foi em uma revista – que não era da especialidade – que o médico leria, lá pelos idos de 1975, um anúncio que mudou o rumo de sua vida. “Era uma chamada para 20 alunos, para o primeiro curso de Otoneurologia, em Houston. Me inscrevi rapidamente e fui aceito, o único brasileiro. Fiz o curso e aprendi Otoneurologia, que era algo que ninguém aqui conhecia”, lembra. 

O curso, segundo o médico, era “de uma organização incrível”. “Além de aprender Otoneurologia, eu aprendi a me organizar e isso me ajudou muito”. Na volta, procurou espalhar ao máximo o conhecimento aqui e decidiu repetir o curso no Congresso Brasileiro de Otorrinolaringologia (CBO), em 1977, para 20 alunos. “Recebi 200 inscrições. Depois, ministrei pequenos cursos em vários locais do Brasil, com outros dois colegas da Otoneurologia. Fomos a praticamente a todos os estados, sendo um por mês, por alguns anos.” 

Foto: Arquivo Pessoal

Dr. Clemente Isnard operou bastante, principalmente ouvido, nariz e amídalas. Trouxe técnicas dos EUA e da Venezuela para o implante de membrana timpânica, outra novidade até então. “Retirava de cadáveres e colocava em pessoas. Esse procedimento é uma espécie de ‘avô’ dos implantes cocleares”, explica. 

Hoje, ele segue afastado da prática médica, mas isso não o impede de observar as tendências. “Temos muitos otorrinos fazendo cirurgia plástica, a parte funcional. Nos EUA, existem otorrinos que são cirurgiões plásticos, especialistas no tema”, destaca. Só que tudo isso, segundo o médico, depende do conhecimento das tecnologias. “Tudo deve ser feito no intuito de melhorar a vida dos pacientes.” 

Foto: Arquivo Pessoal

Depois de tudo, a vida em família. Vivendo com tranquilidade após mais de cinco décadas de uma bem-sucedida carreira médica, Dr. Clemente Isnard dedica hoje suas atenções aos cinco netos adolescentes. Pai de três filhos – além da Dra. Roberta, integram a prole a Dra. Fernanda Levy, que é dentista, vive no Canadá e dá aulas na The University of British Columbia, e o empresário Hugo Ribeiro de Almeida. Nenhum dos netos pretende, até o momento, se dedicar à medicina. Mas isso não o entristece, nem o preocupa.  

Como mensagem às próximas gerações de otorrinolaringologistas, Dr. Clemente Isnard dá apenas um conselho. “Sejam organizados. Sempre tive o cuidado de, ao final de cada ano, estabelecer um planejamento que contemplasse família, medicina e ensino. A família, para mim, sempre veio em primeiro lugar, porque é a base de tudo e o que de mais importante temos.”

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58 anos de Otorrinolaringologia e muita história para contar!

Dr. Orozimbo Alves da Costa Filho